quinta-feira, 23 de outubro de 2014

O consumo serve para pensar?

Qual seria o significado da palavra consumo? Sua etimologia deriva do latim consumere, que significa comer, desgastar, desperdiçar. Há quem diga que, além disso, o ato de consumir está relacionado à satisfação pessoal, ou seja, aos gostos e aos caprichos. Mas estaria esse senso comum coincidindo com o bom senso?


Quem vai nos responder a essa pergunta não é nada mais, nada menos, que o antropólogo argentino Nestor García Canclini (La Plata, 1939). Adepto dos Estudos da Recepção na América Latina, defende que a comunicação só é eficaz se houver a interação entre emissor e receptor e, ademais, utilizando das ideias dos Estudos Culturais procurou analisar a comunicação, a cultura e a sociologia sob uma ótica latina.

Voltando na pergunta inicial, Canclini através do seu livro “Consumidores e Cidadãos”(1995), especificamente no capítulo “O consumo serve para pensar”, nos mostra que o consumo, diferentemente dos julgamentos moralistas, é algo a mais do que simples questões de gosto, de desejo ou de compras desenfreadas, trata-se de “um conjunto de processos socioculturais em que se realizam a apropriação e o uso dos produtos.” Seu impacto é tão grande na sociedade, que alguns pensadores chegam a apontar que os direitos dos cidadãos estão sendo transformados em direitos de consumo, uma vez que as pessoas se preocupam mais em fazer exigências ao mercado do que em participar de assuntos que realmente envolvem a cidadania, como é o caso das questões de esfera política.

Consumir certos bens ditam quem você é, a qual “grupo” você pertence,  qual a sua posição, qual o seu status. Se uma mulher, por exemplo, usa Louis Vuitton, Prada ou Chanel subentende-se que está diante de uma empresária ou uma modelo de sucesso. O mesmo acontece com um homem que ao se vestir totalmente de preto, com cabelo alternativo e maquiagem escura, estará sujeito a comentários de ser gótico.

O consumo, sem nenhuma dúvida, está relacionado aos bens simbólicos; ele deixa de ser um ato irracional para se tornar uma ação social e cultural. Qual o pai que não se sente pressionado em dar um presente para o seu filho no Dia das Crianças? Qual a mãe que não quer comprar um ovo de chocolate para os garotos em plena Páscoa? E no Natal? Qual a dona de casa que não quer ver sempre a mesa repleta de comidas para a sua família? Nota-se, que são hábitos impostos pela cultura na qual vivemos e o consumo, como sempre, não fica de fora dessa; ele está sempre presente, o verdadeiro e legítimo carro-chefe de toda a produção! 

As grandes empresas, por sua vez, utilizam desses valores simbólicos para aumentar ainda mais a venda dos seus produtos. A Coca-Cola, por exemplo, sempre valorizou o simbolismo das datas. A sua própria propaganda de Natal do ano passado utiliza da figura do Papai Noel para divulgar o seu produto, ela não quer simplesmente chegar e fazer com que você compre, mas sim deseja que o consumidor associe o consumo desse bem ao espírito do Natal; como se fosse algo natural, indispensável para uma boa ceia.


E o consumo consciente? Estaríamos nós em uma situação sem saída? Não, claro que não. Se atuarmos como cidadãos estaremos diante dele e, nas palavras do próprio Canclini, só assim, “o consumo se mostrará como um lugar de valor cognitivo, útil para pensar e atuar significativa e renovadoramente, na vida social.”



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